Por que Deus Enviou/Permitiu a Pandemia do Coronavírus?
Essa inquietante pergunta (que poderia incluir também terremotos, tsunamis, furacões e outros desastres naturais) pode ser respondida das mais diversas formas, dependendo, evidentemente, da perspectiva a partir da qual for abordada. Aliás, há mais de dois mil anos, o filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.) propôs o seguinte raciocínio acerca do problema do mal (que ficou conhecido como paradoxo ou dilema de Epicuro), o qual gostaríamos de adaptar para o contexto da presente reflexão:
Se Deus quer acabar com o Coronavírus, mas não pode, então Ele é impotente. Se Deus é capaz de destruir essa doença, mas não quer, então Ele é malévolo. Por outro lado, se Deus tanto é capaz de dar um basta a essa pandemia quanto quer fazê-lo, então, por que não o faz?
Antes de respondermos a tal arrazoado, devemos sugerir, ao menos, duas hipóteses. Primeira, embora não seja possível provar, contudo, pode-se conjecturar que a atual pandemia seja uma expressão do justo juízo divino contra a humanidade. Caso alguém sinta-se ofendido com esse tipo de posicionamento ou o rotule como “extremado”, basta folhear as Escrituras e constatar que Deus, por diversas vezes, é descrito enviando a “pestilência” (hebr. deber) com propósitos punitivos (p.ex., Lv 26:25; Dt 32:24; 2 Sm 24:13-15 // 1 Cr 21:11-14; 2 Cr 7:12-14; Sl 106:29; Jr 14:11-12; 24:10; 27:8; 29:17-18; 42:15-17; 44:13; Ez 5:11-12,17; 6:11-12; 14:19,21; 28:23; 38:21-22; Am 4:10; Hc 3:5). Logo, a partir do momento em que admitimos a existência de Deus (tal como retratado na Bíblia), torna-se inevitável chegar a uma de duas conclusões: ou Deus enviou a presente epidemia (com propósitos punitivos) ou Ele, ao menos, a permitiu (por razões que nos são desconhecidas). Aqui não há um meio termo a seguir.
Em segundo lugar, pode-se especular, de forma contrária, que Deus não existe e que, portanto, essa pandemia seja o resultado de meras forças impessoais que afetam aleatoriamente algumas pessoas e não outras. Entretanto, se este for o caso, por que então deveríamos nos preocupar com essa doença? Afinal, tudo não passa de matéria em movimento e, por conseguinte, mais cedo ou mais tarde essas coisas acontecem mesmo. Ademais, se Deus não existe, tanto faz se um cachorro morre atropelado no trânsito ou se milhares de pessoas morrem de Coronavírus, certo? E, se não, com base em qual fundamento poderíamos afirmar que pessoas valem mais que cachorros? Ora, se Deus não existe, então não temos uma base moral pela qual possamos justificar que uma coisa é certa e outra é errada. No final das contas, tudo se torna apenas uma mera questão de gosto pessoal, puro subjetivismo relativista. Sendo assim, a primeira hipótese parece-nos a mais adequada.
Bem, voltemos à nossa adaptação do dilema de Epicuro, buscando respondê-la.
(1) Se Deus quer acabar com o Coronavírus, mas não pode, então Ele é impotente. Esta é a perspectiva do Teísmo Finito, noção teológica esta segundo a qual Deus deseja destruir o mal, mas é incapaz de fazê-lo por ter poder limitado. De acordo com esse pensamento, embora Deus queira acabar com o Coronavírus, todavia Ele não pode realizar o Seu desejo. Isto se dá porque Ele é impotente. Respondemos a essa proposição afirmando que Deus é Onipotente e que, por conseguinte, Ele pode acabar com o Coronavírus. Em Gn 18:14a, o próprio Deus pergunta a Abraão: “haveria coisa alguma difícil ao Senhor?” e, no Novo Testamento, Jesus diz aos seus discípulos que “para Deus todas as coisas são possíveis” (Mc 10:27). Assim, Deus tem todo o poder de acabar com essa pandemia.
(2) Se Deus é capaz de destruir essa doença, mas não quer, então Ele é malévolo. Assim argumentariam os defensores do Teísmo Ponerológico, neologismo este que cunhamos a fim de descrever a concepção de um deus malvado, tal como aquele retratado por Marcião de Sinope (85-160 d.C.) consoante a sua equivocada concepção da divindade do Antigo Testamento. De acordo com tal concepção, Deus é mau e, por isso, envia doenças às pessoas porque tem prazer no sofrimento das mesmas. Replicamos a esse entendimento ponderando que Deus é Onibenevolente e que, em vista disso, Ele deseja o bem de Suas criaturas. Em meio à sua oração sálmica, o salmista, dirigindo-se ao Senhor, diz que “tu não és um Deus que tenha prazer na iniquidade, nem contigo habitará o mal” (Sl 5:4) e, em outro contexto, lemos que “o Senhor é bom para todos, e as suas misericórdias são sobre todas as suas obras” (Sl 145:9). Logo, o fato de Deus eventualmente não querer destruir o Coronavírus não significa, de modo algum, que Ele seja malévolo. Esse ponto será retomado no próximo item.
(3) Se Deus tanto é capaz de dar um basta a essa pandemia quanto quer fazê-lo, então, por que não o faz? Redarguimos reafirmando a onipotência divina (como descrita acima) por um lado e, por outro, asseverando que não temos como saber se Deus quer dar um basta ao Coronavírus. Mas, certamente, se quisesse Ele o faria. A questão real é que nós, seres humanos absolutamente finitos e limitados no tempo, no espaço e na compreensão, não nos encontramos numa posição vantajosa que nos possibilite julgar com segurança as ações de Deus. Este, por sua vez, por conhecer o fim da história desde o início (Is 41:22-23; 46:9-10), e por ser Onipotente e Onissapiente, reúne todas as condições necessárias que o habilitam a guiar a história teleologicamente, isto é, a fim de que esta cumpra os Seus propósitos. Isto significa que Deus tem boas razões para enviar/permitir a presente pandemia, visto que Ele sabe exatamente como instrumentalizá-la para o cumprimento dos Seus desígnios, que, da nossa perspectiva, são insondáveis.
Em vista do exposto, concluímos a nossa breve reflexão afirmando que o Deus das Escrituras não é como o Deus do Teísmo Aberto. Este último, por desconhecer o futuro, visto que este se lhe apresenta “aberto” (indefinido), foi apanhado de surpresa pelo surgimento do Coronavírus. Portanto, tal divindade, criada conforme a imagem e semelhança humana, não é digna de confiança e credibilidade. Já o Deus da Bíblia é Onisciente e, portanto, sabe porque enviou/permitiu o Coronavírus. Além disso, Ele é Onipotente e, desse modo, pode acabar com essa doença. Por fim, Ele é Onissapiente e, assim, é sábio para operacionalizar tal pandemia a fim de que esta execute o Seu plano providencial.
Em suma, confiemos em Deus, pois Ele sabe exatamente o que faz!