A casa do horror

Luiz Fernando dos Santos
26/11/2020
Etica e Política
Devocional

“Pois chegou a hora de começar o julgamento pela casa de Deus; e, se começa primeiro

conosco, qual será o fim daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus?” (1 Pe 4.17)

Às vezes tenho a sensação de que a Pandemia colocou uma lente de aumento sobre as

mazelas da igreja. Quase não houve dia em que as manchetes dos jornais e revistas não

estampassem algum podre nosso. Falo nosso, porque essas coisas aconteceram na Igreja, com

membros da Igreja, não obstante pessoalmente não ter em absoluto qualquer envolvimento,

não sou menos atingido e talvez não queira dizer que não possua alguma culpa. Os jornais e

revistas não se cansaram de jogar luz na pastora que maquinou um macabro plano para

assassinar o marido, igualmente pastor. Sem falar no fato de que ambos, pastor e pastora não

só praticavam orgias sexuais e faziam pactos de sangue com os filhos adotivos, mas os

ofereciam como serviçais sexuais para outros pastores. Houve ainda aquele outro flagrado no

motel com meninos e meninas de dez, onze anos. Um outro simplesmente agrediu a esposa

durante uma live. Na “ala” católica romana do cristianismo a coisa também não anda nada

boa. Um Cardeal, que possui um estranho relacionamento com uma senhora em Roma,

desviou milhares de Euros do banco do Vaticano e fez inúmeras operações ilícitas para

favorecer familiares e se enriquecer de maneira fraudulenta. Há também o caso do padre

preso nos Estados Unidos fazendo sexo grupal no altar da Igreja, no mesmo altar onde

celebrava a Eucaristia. Também há o caso de um padre acusado de pedofilia e do bispo que,

agora responde à justiça, o fato de ter conhecimento das graves acusações e ainda sim,

encobrir e promover o sacerdote. Pela graça e misericórdia de Deus e só pela graça, não tenho

nenhum envolvimento com os fatos acima e ainda, por misericórdia de Deus, não tenho feito

nada parecido, até aqui. Confesso que me sinto atingido, sofro com essas notícias e muitas

vezes me envergonho com a publicidade e os efeitos negativos desses fatos que rapidamente

se generalizam e colocam a todos, inclusive a mim, nessa vala comum de corrupção moral e

podridão. Mas, como disse, não sou de todo inocente. Talvez se eu tivesse me dedicado mais à

oração, me consagrado mais a Deus, se tivesse pregado o Evangelho com mais poder e

entusiasmo, se eu tivesse enfrentado e desmascarado os falsos profetas e os lobos

transvestidos de pastores com mais audácia e coragem, quem sabe muitos dos males

semelhantes a esses não teriam acontecido. Se eu tivesse investido mais em minha santidade

pessoal, cultivado mais a pureza do coração, se tivesse confessado mais sinceramente os meus

pecados e tivesse sido menos hipócrita no meu seguimento de Cristo Jesus, talvez haveria

menos ocasião em torno da minha vida para que o escândalo e o mal se instalasse.

Seguramente essa casa dos horrores em que muitos segmentos cristãos têm se tornado nos

últimos dias não passa necessariamente por dificuldades estruturais e organizacionais. Não em

um primeiro momento. A caixa de Pandora aberta é o nosso coração desafeiçoado de Cristo.

É o nosso coração que abriga a impudicícia, a ambição desmedida, a avareza, o ódio, o

egoísmo endêmico e adâmico e os altares erigidos e bem conservado aos ídolos do mundo.

Esses escândalos todos são projeções dos nossos corações sob demãos de cosmético

religioso, que possui a aparência de piedade e que faz subir aos lábios palavras doces para

Deus e ‘amanteigada’ para os irmãos, mas que escondem a peçonha de nossos corações vis e

corruptos. Faríamos um bem incalculável se, de repente, nos preocupássemos menos (não

disse de todo), com esses escândalos públicos e deixássemos de apontar o dedo em riste para

os seus atores e nos preocupássemos, aí sim sem exagero, com o desgoverno e a rebeldia dos

nossos corações e clamássemos por mais misericórdia enquanto confessamos as nossas

iniquidades. Está mais que na hora de romper com essa religiosidade gospel, com esse

nefasto subproduto cultural evangélico e abandonar as “modinhas” dessa religião classe

média e voltarmos às raízes do Evangelho. Precisamos de um cristianismo raiz! Está mais que

na hora de abandonar a igreja-entretenimento, a igreja-terapêutica, a igreja-amiga e não sei

mais quantas existem, para voltarmos simplesmente ser a Igreja do Evangelho puro e simples,

a igreja de pecadores redimidos que auxiliados pela graça, estão em uma renhida batalha

contra o seu coração e as incitações do mundo ao pecado. Está na hora de nos inconformar e

desconformar do mundo, seu estilo de vida e seus padrões. Já amadureceu o tempo de

recuperarmos uma identidade de antítese ao mundo e de uma mais perfeita identificação com

Cristo, sua vida e seu Reino. Para que isso aconteça é preciso que nos voltemos à Bíblia com

fome da palavra, que os nossos púlpitos sejam ocupados por profetas e não por profissionais

da religião ou pastores de aluguel. Precisamos que em cada igreja haja um homem, com

uma Bíblia na mão, o coração pegando fogo e a lógica em chamas, bradando: “Assim diz a

Palavra do Senhor”. Somente quando os nossos corações forem saturados da Palavra de Deus

é que ocasiões pecaminosas com essas não ocuparão as manchetes com tanta frequência.

Reverendo Luiz Fernando, com temor, Pastor da Igreja presbiteriana Central de Itapira.